Dismetria dos

membros inferiores

Autores:

1- Inês Massano Simão, Interna de Formação Específica de Medicina
Geral e Familiar, USF Ossónoba, ULS Algarve

2- Yvan Serandão Rodrigues, Assistente Graduado de Medicina Geral e
Familiar, USF Ossónoba, ULS Algarve

Introdução


A dismetria dos membros inferiores refere-se à desigualdade >1cm no comprimento dos mesmos1, geralmente associada a alterações de alinhamento1. Pode ser ligeira (1-3cm), moderada (3-6cm) ou grave (>6cm)1.


Epidemiologia


Cerca de 2/3 da população tem dismetria <2cm e, geralmente, é bem tolerada2 . Quando a dismetria é >2cm, o utente compensa a diferença caminhando em pontas do pé da perna mais curta ou fletindo o joelho do membro mais comprido2. Na população infantil a dismetria varia entre 3 a 15%1. Na maioria dos casos, os ossos afetados são o fémur e a tíbia3. Apenas 1 em cada 1000 casos requer a utilização de dispositivos de correção4.

Classificação


A dismetria pode ser classificada em constitucional ou adquirida1. A dismetria constitucional resulta de alterações da estrutura óssea e da sua capacidade de crescimento1,4. A dismetria adquirida é consequente a lesões externas ao osso que prejudicam ou atrasam o crescimento da fise1,4.

Etiologia

Tabela 1 – Etiologia da dismetria dos membros inferiores.1,4

Sinais e Sintomas


Embora uma pequena diferença no comprimento das pernas possa não causar sintomas, uma diferença significativa pode causar claudicação e dificultar a corrida e as brincadeiras da criança/adolescente3. Normalmente, a criança nivela automaticamente a bacia, fletindo o membro mais comprido ao nível do joelho1. Outras crianças deambulam na ponta do pé da perna mais curta. Estas alterações exigem esforço ao andar pelo que a criança/adolescente pode cansar-se facilmente3.

Avaliação Clínica

Os pais são, geralmente, os primeiros a detetar a diferença de comprimentos dos membros inferiores3. A anamnese deve ser orientada para despiste das patologias subjacentes à dismetria1. O exame objetivo permite identificar a existência e a gravidade da dismetria, assim como o(s) segmentos(s) afetado(s)1. A observação da marcha é essencial para verificar a forma como a criança/adolescente compensa a dismetria dos membros inferiores – fletindo o joelho ou andando na ponta dos pés3. O sinal de Galleazi (Figura 1) pode ser utilizado para avaliar a desigualdade no comprimento das pernas. O exame é feito com o utente em decúbito dorsal, com anca e joelhos fletidos4. O teste é positivo se a altura dos joelhos for assimétrica4. Também é útil para determinar se a desigualdade do comprimento das pernas é principalmente à custa do comprimento do fémur ou da tíbia4. O teste do tacão (Figura 2) permite quantificar a dismetria2. É um dos testes mais precisos e consiste na colocação de blocos de madeira calibrados sob a perna mais curta com o utente em ortostatismo, até se obter o nivelamento aparente da bacia e, em seguida inferir a discrepância do comprimento das pernas (dismetria clínica)1, medindo pelas cristas ilíacas ou pela espinha ilíaca anterosuperior2. A medição da distâncias entre a espinha ilíaca anterosuperior e o maléolo interno com uma fita métrica, permite diagnosticar diferenças com uma precisão de 1cm1,4. A avaliação do arco de movimento permite identificar bloqueios ou limitações articulares1. O envolvimento dos membros superiores e da face permite colocar a hipótese de uma hemihipertrofia1. A avaliação das articulações da anca, joelho do tornozelo, do tónus muscular e do tipo de marcha são igualmente essenciais para um diagnóstico correto1,2. A contratura do quadril, do joelho e do tornozelo afetam o comprimento aparente do membro e, especificamente, a contratura do quadril causa encurtamento aparente do lado aduzido4.

Exames Complementares


Para determinar radiograficamente a diferença no comprimento das pernas, deve obter-se uma radiografia extralonga dos membros inferiores em ortostatismo, com equalização do comprimento das pernas através da colocação de blocos sob o membro mais curto2,6. A medição segmentar é mais precisa a partir da pré-adolescência1. A utilização destes meios pressupõe uma avaliação seriada a partir da idade em que a criança colabora na execução do exame, com uma periodicidade recomendada variável de 1 a 3 anos1.

Tratamento


Os objetivos do tratamento são alcançar o equilíbrio pélvico e a proporcionalidade dos membros e evitar a claudicação, sem causar morbilidade ou risco excessivo e respeitando a altura mínima aceitável1,4.  A severidade do caso, a previsão da altura e da dismetria no final do crescimento determinam a escolha da técnica a utilizar: compensação, alongamento, encurtamento ou protetização1,4. Dismetrias <2cm são as mais frequentes e não necessitam de tratamento dado que o próprio utente consegue compensar a diferença de comprimento das pernas7. Neste caso, poderá ser necessário vigiar regularmente o crescimento da criança/adolescente, até estar completo, com o objetivo de perceber se a dismetria progride ou permanece estática3. Nas dismetrias entre 2-5cm sugere-se a correção com palmilha, epifisiodese ou encurtamento da perna5.  Nas dismetrias entre 5-15cm recomendam-se procedimentos de alongamento da perna e encurtamento da perna contralateral. Se a dismetria for superior a 15cm e o membro é funcional, está recomendado o alongamento e encurtamento do membro contralateral. Porém, se o membro não é funcional, recomenda-se a utilização de uma prótese de extensão ou amputação e consequente protetização2,5.

Complicações


Geralmente, uma diferença >1cm é suficiente para alterar a biomecânica normal e causas limitações funcionais, tais como distúrbios da marcha e da postura5. A dismetria também pode conduzir a contratura em equino do tornozelo, escoliose postural, desequilíbrio pélvico, artropatia da anca, lombalgia, fraturas de stress e doença articular degenerativa prematura2,5.

Mensagens-chave:


- Dismetria <2cm e, geralmente, é bem tolerada.
- Uma diferença significativa no comprimento dos membros inferiores pode causar claudicação e dificultar a corrida e as brincadeiras da criança/adolescente.
- A observação da marcha é essencial para verificar a forma como a criança/adolescente compensa a dismetria dos membros inferiores.
- A avaliação imagiológica da dismetria requer a realização de uma radiografia extralonga dos membros inferiores em ortostatismo, com equalização do comprimento das pernas através da colocação de blocos sob o membro mais curto.
- Dismetrias <2cm são as mais frequentes e não necessitam de tratamento.

Referências Bibliográficas

1 - Sant’Anna F. Diferença de comprimento/Dismetria dos Membros [Internet]. 2018 [cited 2023 Mar 10]. Available from: https://pedipedia.org/artigo-profissional/diferenca-de-comprimento-dismetria-dos-membros

2 - Alves C. Desvio do Eixo dos Membros Inferiores e Dismetrias. Coimbra; 2023. 

3 - American Academy os Orthopaedic Surgeons. Lower Limb Lenght Discrepancy [Internet]. 2023 [cited 2023 Mar 17]. Available from: www.orthoinfo.aaos.org/en/diseases--conditions/limb-lenght-discrepancy/

4 - McCarthy JJ, MacEwen GD. Management of Leg Length Inequality. 2001. 

5 - Queirós AFC, Costa FG. Leg lenght discrepancy: a brief review [Internet]. Universidade do Porto; 2018. Available from: https://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/114362/2/278728.pdf

6 - Vogt B, Gosheger G, Wirth T, Horn J, Rodl R. Leg Lenght Discrepancy - Treatment Indications and Strategies. Dtsch Arztebl Int. 2020;117:405–11. 

7 - de Pablos J. Dismetrías de los Miembros Inferiores. MBA Inst [Internet]. 2015;13:3–16. Available from: http://www.mbainstitute.eu/recursos/boletines/12mk075-boletin-mba-institute-bo13-150ppp.pdf

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